Setembro trouxe consigo chamas diversas: devastadoras, de resistência e de esperança. As chamas do incêndio que consumiu o Museu Nacional e parte importante da nossa história, ciência e cultura. E outras chamas, que ao invés de nos consumir, nos alimentam, nos fortalecem e reúnem no calor do nordeste brasileiro, em Salvador, 3.500 pesquisadores, que acreditam na Educação, na Pedagogia, na Didática e nas Práticas Educativas como possibilidades de resistência por meio da reflexão crítica e coletiva.
Imbuídos por tais chamas, nós, comunidade de pesquisadores, educadores e estudiosos da Didática, reunidos no XIX Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - ENDIPE, em Salvador – Bahia, entre os dias 03 e 06 de setembro de 2018, instigados pelas discussões que apresentam um panorama da Didática situada em um contexto de crise e retrocessos nas políticas educacionais brasileiras, em decorrência da ruptura democrática, assumimos uma posição que vincula a Didática ao movimento de luta em defesa da educação pública e da valorização do estatuto de profissionalidade docente ameaçado pelo avanço de forças conservadoras que engendram um modo utilitarista de pensar o lugar social da escola diante de uma pauta reacionária.
Sob a pressão de organismos internacionais a Didática se encontra cercada e constrangida por demandas neotecnicistas que destituem a complexidade do ato didático, como processo crítico, criativo e emancipatório.
Para onde vai a Didática? Para onde vamos levar a Didática? Nesse cenário de incertezas em torno do futuro da democracia brasileira, o caminho da Didática necessariamente exige um encontro com questões que expressem a preocupação com a formação política de professores e alunos que, conscientes da necessidade de reinvenção da escola, tenham possibilidade de construir trajetórias de resistência, mudança e superação de desigualdades.
Interpelados por vozes e ações que acusam a Didática de haver falhado na formação de professores e melhoria da escola, fragilizando a importância do conhecimento e da pesquisa em didática sob um referencial crítico criativo, nós, 3.500 participantes do XIX ENDIPE, que representamos um grande coletivo de pessoas nas diferentes regiões do país, afirmamos que a Didática existe, resiste e se reinventa.
Diante desse cenário, de profundas tensões e contradições, vimos a público:
- Manifestar o vigor crítico da Didática na agenda dos estudos e práticas pedagógicas no país, demonstrado no volume de pesquisas e experiências construídas no Brasil nas últimas quatro décadas;
- Resistir em relação à fragmentação do conhecimento e do ato pedagógico, compreendendo que não se deve submeter a formação humana à perspectiva utilitarista defendida pelos organismos internacionais e interesses privatistas;
- Defender a escola pública como ponto de partida e de chegada para a formação docente;
- Afirmar que a Didática está, sim, presente em diferentes movimentos de ressignificação dos processos de ensino e aprendizagem em escolas brasileiras que apontam possibilidades de inovação e mudança, que não se enquadram no sentido de educação escolar produzido pelo discurso neoliberal;
- Fortalecer o conhecimento didático como um instrumento crítico e propositivo necessário à luta e trabalho cotidiano de professores para criar espaços de formação humana de qualidade pedagógica e social e que tal conhecimento não se reduza à operacionalização de guias de ensino enquadrados por organismos de gestão de políticas educacionais;
- Reivindicar que os resultados dos estudos realizados pelos pesquisadores sobre a Didática possam ser tomados como referências para a avaliação e proposição de políticas educacionais, assim como os coletivos de pesquisadores que se debruçam sobre o fenômeno educativo possam participar de tais processos;
- Reafirmar a Pedagogia como Ciência da Educação e a Didática como parte importante dessa ciência que colabora para a compreensão crítica dos limites e possibilidades da práxis pedagógica no momento presente;
- Lutar contra a fragmentação da Didática tendo em vista seu importante papel na formação do professor como intelectual crítico e reflexivo, que analisa, compreende e cria possibilidades formativas comprometidas com a emancipação humana.
Como forma de resistir às chamas da deformação neoliberal praticada pelos organismos internacionais e de mercado da da educação e confrontar a precarização que reduz os saberes da docência a uma dimensão técnica, conclamamos todos à defesa da Didática!